A ONU não condenará o ataque químico na Síria. A Rússia saiu em defesa do regime de Bashar al-Assad e mostrou mais uma vez seu poder de bloqueio no Conselho de Segurança da organização. O Kremlin acusou nesta quarta-feira, contra todas as evidências, os rebeldes de esconderem armamento químico. Já o Reino Unido, a França e os Estados Unidos condenaram o bombardeio, que causou a morte de 72 pessoas, entre elas 23 crianças. O próprio secretário-geral da ONU, o português António Guterres, qualificou o ataque como “crime de guerra”. A Organização Mundial da Saúde (OMS) relatou que os sintomas descritos coincidem com os de um ataque com agentes químicos.
Segundo a versão exposta em Moscou pelo porta-voz do Ministério de Defesa russo, Igor Konashenkov, não houve ataque químico por parte das forças de Bashar al-Assad. O que teria ocorrido foi que os gases letais procediam de “um depósito onde os terroristas [rebeldes]guardavam projéteis carregados com agentes tóxicos” e que foi atingido pelos caças do regime. Já Maria Zakharova, porta-voz russa do Ministério de Relações Exteriores da Rússia, disse que uma proposta de resolução da ONU sobre o incidente é inaceitável, pois “seu defeito é antecipar os resultados da investigação e apontar aos culpados”.
O Observatório Sírio de Direitos Humanos diz, entretanto, que o ataque químico foi feito por ar. “Acreditamos que a cifra de mortos vai continuar aumentando, porque há muitas pessoas desaparecidas”, disse a ONG, que funciona no Reino Unido com base numa ampla rede de informantes na Síria.
“Segundo os sistemas de monitoramento aeroespacial da Rússia, nesta terça-feira, entre as 11h30 e as 12h30 [hora local], a aviação síria efetuou um bombardeio nos arredores de Khan Sheikhun contra um depósito de munição dos terroristas”, relatou Konashenkov. “Estas instalações continham fábricas para produzir projéteis carregados com agentes tóxicos. A partir desse grande arsenal [os rebeldes]entregavam armas químicas a milicianos no Iraque”, acrescentou, conforme despacho da agência russa de notícias Itar-Tass.
A declaração russa ocorre em meio a uma onda de condenação internacional praticamente unânime contra o bombardeio supostamente cometido pelos aviões de Assad. Nesta quarta-feira, está prevista uma reunião de urgência do Conselho de Segurança da ONU, a pedido da França e Reino Unido, para discutir o assunto. Estados Unidos, França e Turquia condenaram o ataque, o mais mortífero envolvendo armas químicas desde a ofensiva de 2013 contra a localidade de Ghouta (perto de Damasco), no qual morreram cerca de 1.400 pessoas. O então presidente dos EUA, Barack Obama, responsabilizou Assad por aquele massacre.
Em nota divulgada nesta quarta, a OMS informou que os sintomas apresentados por alguns dos feridos no suposto ataque químico são “consistentes” com os efeitos de um agente nervoso. “A probabilidade de exposição a um ataque químico se vê amplificada pela aparente falta de ferimentos externos, registrada em casos que mostraram um rápido quadro de sintomas similares, incluindo problemas respiratórios agudos como principal causa da morte”, afirma a nota, citada pela Efe.
Condenação internacional
O secretário-geral da OTAN, Jens Stoltenberg, e o presidente do Parlamento Europeu, Antonio Tajani, também condenaram o ataque nesta quarta-feira. “É inaceitável e contradiz os valores que temos o dever de defender, tanto dentro como fora das nossas fronteiras”, declarou Tajani ao abrir a sessão plenária em Estrasburgo (França).
O ministro britânico de Relações Exteriores, Boris Johnson, afirmou que “todas as provas” que viu apontam o regime alauíta de Assad como autor do ataque. A Comissão de Investigação das Nações Unidas sobre a Síria abriu um inquérito. Potências como Reino Unido, EUA e França solicitaram à Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPAQ) que faça uma investigação aprofundada. O texto da solicitação foi encaminhado aos 15 membros do Conselho de Segurança na véspera de uma reunião de emergência que ocorrerá nesta quarta em Nova York, relata a France Presse.
O Observatório alertou que nas últimas horas houve novos bombardeios em Khan Sheinkhun (com 75.000 habitantes), realizados por aviões de guerra não identificados. Segundo a Defesa Civil Síria, que presta serviços de resgate em áreas fora do controle das forças governamentais, o ataque expôs quase 300 pessoas a substâncias químicas.
EL PAÍS