A presidente da Coreia do Sul, Park Geun-hye, se desculpou nesta sexta-feira (9) aos cidadãos em discurso televisionado após entregar todos seus poderes ao primeiro-ministro, Hwang Kyo-ahn, depois que o Parlamento aprovou seu afastamento por causa de seu envolvimento em um escândalo com Choi Soon-sil, conhecida como “Rasputina”.
A presidente foi apontada como cúmplice de Choi Soon-sil, sua amiga íntima acusada, entre outras coisas, de interferir em assuntos de Estado sem possuir cargo público, além de ter pressionado empresas para obter numerosas somas de dinheiro que ela teria se apropriado parcialmente.
Park afirmou que “leva a sério as vozes da Assembleia Nacional e do povo” no discurso feito após uma reunião com seu gabinete, apenas uma hora depois de o Parlamento votar “sim” pela cassação por maioria arrasadora.
O “sim” para o processo de destituição ganhou com 234 votos a favor, 56 contra, sete nulos e duas abstenções, pouco mais de uma hora após começar a sessão, onde votaram 299 dos 300 representantes da Assembleia Nacional.
Park também pediu aos ministros e ao novo líder provisório do país para “fazer todo o possível para minimizar os vazios no governo, especialmente nos âmbitos de economia e segurança”, até que o Tribunal Constitucional dê o veredicto final sobre sua cassação.
A responsabilidade agora está com o Tribunal Constitucional, onde pelo menos seis de seus nove juízes devem dar o sinal verde para a decisão do parlamento, em processo que levaria, no máximo, 180 dias.
Enquanto se aguarda a decisão do Tribunal Constitucional, a presidente será privada de todos seus poderes à frente do Estado, desde o controle do Exército até o direito a veto ou decisões de política externa.
O resultado da votação de hoje revela que a maioria dos 128 deputados do partido conservador da presidente Park (Saenuri) deu as costas a sua líder ao optarem pelo “impeachment”.
A histórica decisão do parlamento foi celebrada por centenas de opositores da presidente concentrados na frente da Assembleia Nacional.
Milhões de pessoas foram para as ruas nas últimas semanas em protestos em todo o país para exigir a saída da presidente por seu envolvimento no caso da “Rasputina”.
Amizade de presidente gera escândalo na Coreia do Sul
A amiga e o naufrágio
O caso que abala a política sul-coreana gira em torno de Choi-Soo-sil, confidente e amiga íntima da presidente, que teria usado sua influência sobre ela para manipular decisões políticas e enriquecer. Choi foi detida em novembro e está esperando para ser julgada por coação e abuso de poder.
Os deputados também acrescentaram como motivo para apoiar o impeachment a atuação de Park após o naufrágio de uma balsa em 2014, tragédia em que 304 pessoas morreram, a maioria estudantes. A gestão do governo na catástrofe foi muito criticada e se questionou por que a presidente levou sete horas após o desastre para realizar a primeira reunião sobre o tema.
Os meios de comunicação citam diferentes teorias, como, por exemplo, as de que Park estava em um relacionamento amoroso, realizando um ritual xamânico, em uma operação estética ou cortando o cabelo. A Casa Azul, sede da presidência sul-coreana, desmentiu todas as teorias, mas não explicou até hoje onde a presidente estava no dia da tragédia.
“Rasputina” e xamanismo
Políticos da oposição e a imprensa sul-coreana chamam Choi de “Rasputina” em alusão a Rasputin, o místico (chamado de “Monge Louco”) que exerceu uma grande influência sobre o Czar Nicolau 2º da Rússia no início do século 20.
Choi, amiga de Park há 40 anos, relia e corrigia os discursos da presidente e até mesmo a aconselhava nas nomeações de integrantes de alto escalão.
O pai de Choi Soon-sil, Choi Tae-min, é o fundador da Igreja da Vida Eterna e um autoproclamado messias, que foi mentor da presidente. Segundo um relatório da agência de inteligência coreana, ele a abordou após a mãe dela ter sido assassinada em 1974, dizendo-lhe que a falecida tinha falado com ele em seus sonhos.
O relatório disse que Choi Tae-min passou a cultivar sua influência sobre Park para solicitar propinas e acumular uma fortuna familiar – na época, a Coreia do Sul era governada pelo ditador Park Chung-hee, pai da atual presidente.
Não há evidência que as atividades xamânicas ainda sejam praticadas pela presidente ou mesmo por Choi Soon-sil, mas a imprensa sul-coreana publicou diversas histórias envolvendo o assunto – inclusive sobre a suposta existência de um grupo de assessoras informais, chamado de “as oito fadas”, que influenciaria diretamente a presidente nos assuntos do governo.