O Brasil tem 54.990 autoridades com direito ao foro privilegiado. É o que mostra estudo publicado recentemente pela Consultoria Legislativa do Senado. No Paraná, são 417 autoridades, das quais 399 são prefeitos.
Um dos autores, o consultor João Trindade Cavalcante Filho, explicou, em entrevista, nesta sexta-feira (5), à Rádio Senado, que em outros países este número está, no máximo, “na casa das centenas”.
“No caso do Brasil, a grande característica é a quantidade”, disse ele. “Vários outros países têm este instituto, mas, geralmente, é para algumas autoridades. Inclusive, bem poucas”. Segundo João, houve um aumento no número de autoridades ao longo do tempo.
“No Brasil, a gente teve, ao longo do tempo, uma progressiva ampliação da quantidade de autoridades que têm esse foro”, explica, ressaltando que ele é previso na Constituição Federal e nas estaduais também. Segundo o especialista, a cada Constituição, novas autoridades eram incluídas, especialmente na Constituição Federal de 1988, que, por causa da Ditadura Militar vigente na época, atribuiu foro a um número recorde de autoridades, incluindo membros do Judiciário.
“Nenhum país chega sequer perto do Brasil nessa quantidade”. Na Áustria, por exemplo, há foro privilegiado para presidente e governadores, que somam apenas algumas dezenas, segundo o especialista. No Brasil, só na Bahia, há mais de 4.800 pessoas com foro privilegiado pela legislação estadual, além das autoridades baianas com foro pela Constituição Federal. “Só a Bahia tem muito mais do que a média dos países do mundo”.
O estudo faz um histórico do desenvolvimento do foro privilegiado no país e foi publicado no momento em que o Senado discute, em segundo turno, a proposta de emenda constitucional (PEC 10/2013) que acaba com o mecanismo no caso de crimes comuns.
A PEC foi aprovada em primeiro turno por unanimidade no dia 26 de abril e seguirá para a Câmara dos Deputados se passar por uma segunda votação no Plenário do Senado.
Proposta
A matéria foi apresentada pelo senador Alvaro Dias (PV-PR) e a versão em discussão é a do substitutivo apresentado pelo relator, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que consolidou a PEC 10/2013 com outra proposta, a PEC 18/2014, do senador Acir Gurgacz (PDT-RO), acolhendo emendas.
De acordo com o substitutivo, o foro privilegiado fica extinto para todas as autoridades nas infrações penais comuns. Fica mantido o foro por prerrogativa de função apenas para os chefes dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário da União.
A PEC também permite a prisão de membros do Congresso Nacional condenados em segundo grau nas infrações comuns. Hoje, eles são julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e só podem ser presos após condenação definitiva dessa Corte.
A expectativa é que esteja pronta para ser votada novamente no dia 9.
Foro privilegiado
Foro privilegiado não é um privilégio de uma pessoa, mas do cargo que ela ocupa. O mecanismo é garantido a determinadas autoridades por haver, segundo o entendimento da lei, a necessidade de proteção do exercício de determinada função ou mandato, que depende do cargo que a pessoa a ser julgada ocupa.
O artigo 5º Constituição Brasileira estabelece que todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país são iguais perante a lei, mas o foro por prerrogativa de função, mais conhecido como foro privilegiado, pode ser considerado uma exceção a essa regra.
A análise de processos envolvendo pessoas que gozam de foro privilegiado é designada a órgãos superiores, como o Supremo Tribunal Federal, o Senado ou as Câmaras Legislativas. Acredita-se que, com isso, pode-se manter a estabilidade do país ao ter uma autoridade como alvo de investigação, e garantir isenção no julgamento de autoridades do Executivo, Legislativo ou do próprio Judiciário.
No Brasil, entre as autoridades que têm o foro por prerrogativa de função, estão o presidente da República, os ministros (civis e militares), todos os parlamentares, prefeitos, integrantes do Poder Judiciário, do Tribunal de Contas da União (TCU) e todos os membros do Ministério Público. A medida é alvo de crítica de muitos juristas.
O foro privilegiado garante tratamentos diferentes a réus de processos, a depender da importância do cargo da pessoa que é alvo de investigação e do tipo de infração a ser julgada. Crimes comuns ou de responsabilidade têm procedimentos diferenciados, por exemplo.
No caso de Presidente da República e vice, o julgamento seria realizado pelo STF para crime comum, e pelo Senado para crime de responsabilidade. Ministros de Estado envolvidos em processos, por sua vez, têm suas investigações analisadas pelo STF, tanto em caso de crime comum, quanto em casos de crime de responsabilidade. Existe também a possibilidade de o ministro ser julgado pelo Senado, isso acontece no caso de o crime de responsabilidade ser conexo ao do Presidente da República.
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